Aerodinâmica da Trek Madone 8ª Geração

Um ano antes dos lançamentos da Madone 7ª Geração e do IsoFlow, nossos engenheiros começavam a trabalhar no design conceitual da próxima geração da Émonda, nossa bike conhecida por sua leveza. Sabíamos que a Madone era nossa bicicleta de corrida de estrada mais aerodinâmica até então, e estávamos animados para ver como poderíamos incorporar parte de nossas descobertas em aerodinâmica na Émonda.  

Logo após criar nossos primeiros conceitos para a Émonda, que já eram bastante radicais, percebemos que a diferença de desempenho aerodinâmico entre a Madone e a Émonda poderia ser reduzida significativamente. Foi então que a possibilidade de uma única bicicleta de corrida de desempenho começou a ser seriamente discutida. Mas antes precisávamos provar para nós mesmos que nossos atletas e clientes não abririam mão de nada com essa mudança.  

Peso versus aerodinâmica

Nossas primeiras bicicletas conceito no projeto da próxima geração da Émonda foram “A1” e “A2”. Nossos testes em túnel de vento e de fluidodinâmica computacional (CFD) mostraram alguns resultados promissores, reduzindo a distância entre a geração anterior da Madone e da Émonda. Mesmo assim, se quiséssemos produzir apenas uma bicicleta de corrida de alto desempenho, ainda chegaríamos a uma penalidade aerodinâmica inaceitável.  

Nosso próximo passo foi explorar completamente o espaço de design. Desenvolvemos protótipos adicionais em ordem crescente de desempenho aerodinâmico para ampliar a série A, de peso leve, chegando até à série E, focada na aerodinâmica. Após centenas de simulações de CFD e de análises estruturais, levamos as bikes das séries A, C e E de volta ao túnel de vento.  

Todos os nossos testes no túnel de vento são feitos com nosso manequim nos pedais para levar em conta a aerodinâmica de um ciclista.

Com os resultados do túnel de vento e as previsões de peso para todos os três protótipos, pudemos testar virtualmente o comportamento dessas diferentes opções em várias condições de corrida. Usando as mesmas rodas e pneus, queríamos alcançar um design de quadro que superasse tanto a Madone 7ª Geração quanto a Émonda em qualquer inclinação.

O gráfico abaixo mostra o desempenho dos protótipos Madone 7ª e 8ª Geração comparados à Émonda em inclinações que variam de plano (0% de inclinação) a bastante íngreme (12% de inclinação). A aerodinâmica Madone 7ª Geração (na linha branca tracejada) é mais rápida, que a Émonda, mais leve, porém menos aerodinâmica, no intervalo de inclinação entre 0% a pouco mais de 3% — já que a diferença de peso tem um pequeno efeito em planos e subidas leves, e o ciclista se move a uma velocidade maior, aumentando o impacto da aerodinâmica.  

Segundos economizados por hora (positivo = mais rápido que Émonda) vs. Percentual de inclinação.
Pressupostos: Rodas e pneus normalizados, sem vento, potência de 200 watts, ciclista de 70 kg, resistência ao rolamento igual para todas as bikes

O protótipo C3 (amarelo) foi o único mais rápido que a Madone e a Émonda em todas as condições.

Quando analisamos os protótipos, todos melhoraram em relação à Madone 7ª Geração e à Émonda em certas inclinações, mas apenas o protótipo C3 é mais rápido que ambas as bicicletas em todas as condições. A opção leve A1 sobe bem, mas não seria uma boa opção para sprints rápidos em terreno plano. A opção E2, mais aerodinâmica, é melhor em uma inclinação de 0%, mas exigiria que os ciclistas sacrificassem o desempenho da Émonda em escaladas.  

Com esses resultados, observamos que o protótipo C3 tinha o potencial de combinar o peso de uma Émonda com a aerodinâmica de uma Madone, o que (após várias otimizações) abriu caminho para uma única bicicleta de corrida de estrada de alto desempenho – a Madone 8ª Geração. 

Novos formatos aerodinâmicos Full System Foil

Como criar conceitos como os do A1 ao E2, abrangendo características que vão da leveza extrema ao super aerodinâmico, sem anos de tentativa e erro? A resposta está no nosso novo sistema de seções transversais de tubos – o Full System Foil.  

Antes dos formatos aerodinâmicos do Full System Foil, usávamos principalmente os formatos de tubos Kammtail Virtual Foil (KVF). Na época, esses eram formatos revolucionários. Eles proporcionaram maximizar o desempenho aerodinâmico com a regra de proporção comprimento/largura de 3:1 da UCI, hoje já extinta. Os formatos Kammtail são muito aerodinâmicos, mas o desempenho piora à medida que se afasta da proporção de 3:1 das bicicletas aerodinâmicas mais tradicionais.

Para melhorar as formas KVF, criamos um sistema para gerar seções transversais mais flexíveis. Ao fazer com que o software “empurrasse” e “puxasse” as paredes da seção transversal, o sistema permitia criar uma grande variedade de formatos. Em seguida, combinamos esse formato básico com um algoritmo de otimização que empurraria/puxaria para gerar um novo formato e testaria virtualmente sua eficiência aerodinâmica e estrutural. O processo de otimização aprende a partir das iterações de design passadas e, após tempo e cálculos suficientes, ele chega a uma fronteira de Pareto, que é o conjunto de seções transversais que representam as melhores combinações de peso e aerodinâmica.   

Esta animação mostra um pequeno subgrupo de algumas das formas analisadas pelo algoritmo de otimização. Como você pode ver, a natureza flexível da modificação nas formas de empurrar/puxar cria alguns formatos malucos que nunca seriam viáveis, mas isso permite que todo o espaço de design seja explorado – até mesmo as partes ruins. Essa exploração mais ampla é importante, pois pode gerar formatos que talvez não seriam imaginados por um designer humano. 

Durante o monitoramento do progresso da nossa otimização, percebemos que as formas geradas, em geral, apresentavam extremidades traseiras mais arredondadas do que as formas KVF. Além disso, demonstravam melhor aerodinâmica em situações reais de instabilidade aerodinâmica, onde a direção do vento muda rapidamente. As extremidades dianteiras de muitas das formas estruturalmente eficientes eram relativamente retangulares, o que, intuitivamente, fazia todo o sentido.  

Onde a aerodinâmica não é tudo 

Uma vez munidos de um conjunto de formas que variam entre estruturalmente eficientes (leves) e super aerodinâmicas, o próximo passo foi identificar onde encaixar cada opção no quadro. Esta análise sempre faz parte do nosso processo de design do quadro de uma bicicleta, mas fomos mais longe com a Madone 8ª Geração, usando milhares de simulações de Fluidodinâmica Computacional (CFD) e de Análise de Elementos Finitos (FEA) para identificar os melhores pontos no quadro para cada opção de seção transversal.  

Por exemplo, a forma do tubo inferior favorece a eficiência estrutural em detrimento da aerodinâmica, já que o rastro de movimento lento gerado atrás da roda dianteira diminui a importância de formas de baixo arrasto aerodinâmico nessa área. Em contrapartida, o tubo vertical superior, o IsoFlow e o canote são todos projetados para serem formas muito aerodinâmicas, pois o fluxo de ar é mais acelerado entre as pernas do ciclista e aumenta o arrasto nessa região. Basicamente, cada formato é projetado levando em consideração como o ar flui sobre as formas à frente e atrás dele.   

As linhas de fluxo cinza são ar de movimento lento movendo-se para baixo do tubo inferior, o que permite uma seção transversal mais arredondada, mais eficiente estruturalmente e mais leve, com um ganho mínimo de arrasto aerodinâmico.

Muito antes disso, em 1912, Gustave Eiffel (isso mesmo, aquele Eiffel) descobria o quanto de arrasto objetos em formatos cilíndricos geram em seus testes de queda da Torre Eiffel.

Alguns dos resultados originais de arrasto aerodinâmico dos testes de queda conduzidos por Eiffel – incluindo um cilindro.

Então, por que colocamos caramanholas cilíndricas em bicicletas de corrida aerodinâmicas altamente otimizadas? Caramanholas aerodinâmicas não são um conceito novo, mas, por questões de usabilidade e praticidade, não costumam ser usadas em corridas. Nosso objetivo era projetar uma caramanhola e um suporte que fossem práticos durante as corridas da equipe Lidl-Trek. Os ciclistas e a equipe fizeram duas exigências: os suportes das caramanholas aerodinâmicas também precisavam ser compatíveis com caramanholas padrão, e as caramanholas do tubo inferior e do tubo vertical precisavam ser iguais/intercambiáveis.  

Esses requisitos impediram o uso de uma caramanhola super aerodinâmica como a Caramanhola de tubo Inferior da Speed Concept. Para compensar isso, projetamos as seções transversais das garrafas do tubo inferior e do tubo vertical para funcionarem em conjunto com as seções transversais do quadro e das rodas, criando um aerofólio virtual. Na imagem abaixo das nossas simulações de fluidodinâmica computacional (CFD), o ar que se move lentamente é exibido em cinza. O ar em deslocamento rápido identifica esses rastros de movimento lento como se fossem objetos sólidos e flui suavemente ao redor deles, reduzindo o arrasto aerodinâmico.  

Nossas Caramanholas RSL Aero economizam 1,8 watts a 35 km/h em comparação às caramanholas padrão de 620 ml (21 oz), e conferem mais velocidade do que não usar caramanholas.

Embora essas caramanholas foram otimizadas para uso com a Madone 8ª Geração, elas também foram testadas utilizando Fluidodinâmica Computacional (CFD) em diversos modelos de quadros de bicicletas, e em todos os casos, reduziram o arrasto em comparação com as caramanholas convencionais.  

Considerando o sistema do ciclista no projeto 

As bikes não se pedalam sozinhas — um ciclista cria um impacto significativo no campo de fluxo ao redor de uma bicicleta. É por isso que testamos todo o sistema do ciclista (bicicleta, ciclista, componentes, caramanholas/suportes) e incluímos um ciclista em nosso design aerodinâmico. Manny, o manequim que pedala foi incluído tanto nas primeiras simulações em computador quanto em nossos testes no túnel de vento. Essa ênfase na aerodinâmica do ciclista é o que levou a inovações como a tecnologia IsoFlow na Madone 7ª Geração. A IsoFlow retorna com algumas pequenas otimizações na Madone 8ª Geração, aumentando o conforto do ciclista e proporcionando benefícios estruturais e aerodinâmicos.  

Na Madone 8ª Geração, o guidão pode até parecer menos aerodinâmico para um observador em comparação com a geração anterior, e isso porque realmente é! Pelo menos isoladamente.  

A seção transversal das partes superiores do guidão da 8ª Geração ficou mais grossa e arredondada do que a da Madone 7ª Geração. Se você colocar apenas a bicicleta no túnel de vento, esse guidão aumentará a resistência ao arrasto aerodinâmico. No entanto, quando um ciclista pedala atrás dele, o rastro do guidão mais grosso reduz ligeiramente o arrasto aerodinâmico nas pernas do ciclista, pois ele desacelera o ar à sua frente. O efeito é pequeno, mas as pernas em movimento são o maior fator de contribuição para o arrasto total do sistema. Por isso, até mesmo pequenas mudanças no fluxo de ar podem ser impactantes. Assim como nos formatos Full System Foil que desenvolvemos, a seção transversal do guidão foi otimizada usando o mesmo processo, mas considerando o efeito das pernas atrás do guidão. 

O resultado é um guidão mais confortável de segurar nas partes superiores, mais leve devido a uma forma estruturalmente mais eficiente, e mais aerodinâmico devido ao efeito de proteção sobre as pernas que pedalam.

Os resultados

Depois de todo esse processo, os resultados do túnel de vento mostram que a Madone 8ª Geração está em um nível aerodinâmico superior ao da Émonda. Em comparação com a Madone 7ª Geração, a maioria das melhorias aerodinâmicas da 8ª Geração é percebida em ângulos de guinada baixos, que são os ângulos de guinada mais comumente encontrados pelos ciclistas.

Testamos as bicicletas em várias velocidades no túnel de vento para simular diversas situações de corrida. Os resultados que apresentamos aqui correspondem a uma velocidade de 35 km/h (22 mph) no túnel. Essa é uma velocidade mais baixa, que torna os testes um pouco mais desafiadores, mas é mais alcançável por ciclistas do que o ritmo de pelotões profissionais. Também fizemos testes em velocidades de até 64 km/h (40 mph), fornecendo simulações para nossos atletas profissionais da Lidl-Trek (mais informações abaixo).  

Coeficiente de Arrasto Aerodinâmico (CDA, m2) vs. Ângulo de Guinada a uma velocidade de túnel de 35 km/h (22 mph)
Bicicletas testadas na mesma configuração SLR de venda

Madone 8ª Geração vs. Madone 7ª Geração vs. Émonda no túnel de vento

Configuração testada no túnel de vento Economia de energia (Watts)
35 km/h
Economia de segundos/hora
200 Watts
vs. Madone 7ª Geração com Caramanholas Cilíndricas, Guidão 7ª Geração de Peça Única, RSL 51s, pneus R3 25c (positivo = 8ª Geração mais rápida)
Madone 8ª Geração com Caramanholas Aero, Guidão de Peça Única, RSL 51s, pneus R3 25c
0,1 0.4
vs. Émonda com Caramanholas Cilíndricas, Guidão Émonda de Peça Única, RSL 37s, pneus R3 25c (positivo = 8ª Geração mais rápida)
Madone 8ª Geração com Caramanholas Aero, Guidão de Peça Única, RSL 51s, pneus R3 25c
11.3 77.8
vs. Émonda com Caramanholas Cilíndricas, Guidão RSL Aero, RSL 51s, pneus R3 25c (positivo = 8ª Geração mais rápida)
Madone 8ª Geração com Caramanholas Aero, Guidão de Peça Única, RSL 51s, pneus R3 25c
6.8 46.1

No entanto, a aerodinâmica não é o único fator que influencia o pedalar uma bike (embora os aerodinamicistas desejassem que fosse!). É por isso que simulamos o desempenho da Madone 8ª Geração em cenários do mundo real para compará-la com a Madone 8ª Geração e com a Émonda. Corridas de ciclismo são dinâmicas, com muitas acelerações e momentos decisivos que ocorrem em poucos segundos. Então, quando apresentamos o conceito da Madone 8ª Geração aos nossos ciclistas da Lidl-Trek, eles queriam ver como ela se comportava nas situações mais decisivas em comparação com a Madone 7ª Geração e com a Émonda.  

Um desses cenários dinâmicos é o sprint da chegada. Simulamos tanto um sprint plano quanto um sprint em subida (inclinação de 4%) durante 12 segundos e a 1.500 Watts. Para quem pedala com um medidor de potência, esse número pode parecer insano, mas é menor do que o observado em Jonathan Milan, em sua recente chegada da Etapa 4 do Giro d'Italia, após um maior período de tempo! 

O outro cenário que examinamos foi o tempo necessário para um ciclista acelerar e recuperar um ataque que passou em uma inclinação de 10%, aumentando sua potência de 280 Watts para 450 Watts para alcançá-lo. Nesse cenário, minimizar o tempo para recuperar o afastamento é fundamental, pois o ciclista deve “dar um gás” e pedalar além do ponto que consegue sustentar confortavelmente por um período mais prolongado. Se demorar muito para alcançar o ataque, o ciclista pode ficar sem energia e não conseguir recuperá-lo. Por outro lado, quanto mais cedo alcançar o ciclista atacante, mais cedo poderá reduzir sua potência para níveis mais sustentáveis na esteira do atacante.

A Madone 8ª Geração é mais rápida em inclinações e em sprints

Bike (configuração SLR de venda) Tempo para alcançar o ataque em uma
subida de 10% (segundos)
Comprimentos de bike ganhos sobre a Émonda,
Sprint plano de 12s
Comprimentos de bike ganhos sobre a Émonda,
Sprint de subida (4% de inclinação) de 12s
Madone 8ª Geração 29 1.08 0.89
Madone 7ª Geração 32 1.03 0.81
Émonda 30

As simulações deixaram claro para a Lidl-Trek que a Madone 8ª Geração não exigiria sacrifícios em cenários e situações decisivas quando comparada à Madone 7ª Geração ou à Émonda. Para conseguir alcançar o ataque na inclinação íngreme de 10%, os ciclistas normalmente prefeririam ter uma Émonda para carregar o mínimo de peso possível, mas a Madone 8ª Geração supera ligeiramente a Émonda nesse cenário. As duas gerações da Madone já figuram em um patamar elevado para situações de sprint, onde a aerodinâmica é de extrema importância, mas a 8ª Geração supera a 7ª em ambos os casos – proporcionando ainda um pouco mais de conforto na chegada em subida.

Em todos esses cenários, os efeitos da aceleração são simulados. Embora seja um efeito sutil, é mais fácil acelerar a estrutura mais leve da Madone 8ª Geração até a velocidade desejada em comparação com a Madone 7ª Geração, por exemplo. 

No final de tudo, o que começou apenas como uma atualização da Émonda acabou culminando na melhor bicicleta para subidas e sprints, que se destaca até mesmo nas demandas exigentes dos nossos ciclistas da Lidl-Trek, enquanto oferece a sensação empolgante de uma bicicleta de corrida leve e de alto desempenho para quem apenas sonha em fazer sprints a 1.500 Watts (como eu).  

Sobre o autor

John Davis é o Líder em Aerodinâmica da Trek Bicycle.
Ele é bacharel em Engenharia Mecânica e Aeroespacial pela Princeton University e mestre em Engenharia Aeroespacial pela Georgia Tech.